2007-08-06

Contos da Primária - Texto 7

O meu colega de carteira , o Angelo , a "menina" , era uma autentica pita chorona ...
Quando o Areias chegava atrasado e ouvia barulho já se sabia que iamos comer todos pela medida grande , o prof mal atravessara a porta já as bagadas corriam pela cara
muito redonda do Angelo . Era contudo o unico ali dentro capaz de me dar um bocado de luta e em muitas coisas era bem melhor que eu , já nem vou falar da caligrafia porque ele tinha uma letra perfeita , muito limpinho , asseado , acho que calçava luvas para abrir o caderno ... Quando falava com ele nunca respondia com medo de ser castigado , era um convite a chafurdá-lo que não conseguiamos ignorar ...
Quando faziamos alguma asneira , estavamos a começar já o Angelo tinha a cara toda molhada .
Um dia antes de começar aula , havia uns problemas dificeis dos trabalhos de casa , o pessoal veio pedir-me para os deixar copiar mas eu não tinha a certeza se estava certo e quis conferir com o Angelo porque ele era outro bom aluno , se estivesse igual provavelmente estaria correcto .
- Angelo , empresta o caderno para ver !
Começam as bagadas pela cara abaixo , nem sim nem sopas , só lagrimas ...
- Angelo , que é que foi , carago ?
= O Sr professor vai-me bater ...
- Ele não vai saber de nada , deixa de ser conas , passa a merda do caderno !
= Ai ele vai-me bater ...
- Vai nada , ele nem vai saber , dá cá o caderno !
= Vai-me castigar ...

Foi mais do que o Fredo Ranhoso podia aguentar , avançou e disse :
- Caralho pro Caralho , tirou-lhe a pasta de repelão , despejou tudo no chão continuou , apanha-me já imediatamente o caderno o com os problemas e dá-mo senão fodo-te a tabuleta ...
Depois de ter o caderno aberto nos problemas perguntou-me , é esta merda ?
Mal tinha acabado de dizer que sim , rasga as folhas do caderno do Angelo e entrega-mas . O Angelo desata num choro , até a mim me apetecia chorar , se ele fosse contar aquilo ao Areias não havia deus no ceu que nos valesse .
Desatinei com o Fredo , és maluco ? Quando ele contar ao Areias estamos fritos .
o Fredo agarrou o Angelo pelos colarinhos e perguntou-lhe , vais contar ?
Não consegiu pronunciar qualquer palavra entre tanto soluçar mas indicou que não com a cabeça .
Ves ? não há problema , rematou o Fredo .
Mais uma vez fiquei a pensar se era corajoso ou apenas estupido , como eu conhecia o Areias aquilo era motivo para um banho de sangue .
Lá verificamos , por acaso estava igual , o pessoal copiou e entretanto chegou o Areias .
Desculpem o termo , não me cabia um feijão no cu , estava tão envolvido naquele trama , bem feitas as contas , tinha deixado copiar os trabalhos , tinha sido eu que queria comparar , até podia ser acusado de desemcaminhar a menina ... Olhava pro Fredo e ele mantinha o mesmo á vontade de sempre , como se nada se tivesse passado .
Aí o Areias reparou nos olhos do Angelo , era impossivel não reparar de tão vermelhos que estavam de chorar .
- Que é que foi Angelo , ainda nem começou a aula já estás a chorar ?
O meu coração parou ...
O Angelo hesitou , olhou para tras pro Fredo que sorria despreocupadamente e a soluçar disse , é que me esqueci do caderno com os trabalhos de casa sr Professor .
Pára lá de chorar , sempre a mesma coisa , mostras-me amanha os deveres , sempre fizestes os teus deveres , esqueceste-te , tudo bem , faz favor de ter mais cuidado , não quero que isto se repita .


Contos da Primária - Texto 6

Nos meus tempos de criança a falta de informação era substituida por dogmas , mitos e tabus que dominavam os comportamentos sociais . Havia por exemplo am mania de não deixar os canhotos usar a mão esquerda para escrever . Talvez vos espante mas isso era visto quase como que uma deficiencia fisica . Como canhoto vivi de perto esse problema .

A certa altura da minha vida , antes da primaria , a minha mãe cujo lema de vida sempre foi " nós somos aquilo que aparentamos ser " e apesar das dificuldades económicas , decidiu colocar-me num desses colégios chiques , A Santa Cecilia ...
Nesse tempo de grandes divisões sociais , o abismo entre mim e os miudos como eu e esses miudos ditos ricos era tão grande que se tornava intransponivel . Aqueles putos chegavam á mesa e a sua preocupação era que talher deviam usar , qual a pinça pros escargots , a maior parte dos miudos que conhecia chegavam á mesa e a sua preocupação era terem algo onde espetar o talher , tinham comportamentos diferentes , estudavam piano , ballet , os chauffers vinham busca-los á porta , falavam esquesito e eram uns conas ... Não gostava deles ... O sentimento era mútuo , eles tambem não gostavam de mim e faziam questão de o mostrar... Fui naturalmente colocado á margem , os unicos que me davam atenção era directora , má como as cobras , que implicava comigo cada vez que me via e uma professora novita que era uma grande cabra , sempre que me apanhava com um lapis na mão esquerda torcia-me a orelha , que grande cabra ...
Fui salvo pelo destino num dia chovoso ...
Romantico , hem ?
Verdade , chovia a potes , por isso a minha avozinha foi-me buscar á escola .
A minha avó era uma mulher do povo , uma vendedora analfabeta e pobre que tinha a coragem dum leão . Não tinha medo de homens nem mulheres , não tinha medo de Deus nwem do Diabo . Nascida em 1900 atravessou 2 grande guerras sempre no seio duma familia pobre , era uma resistente ...
Quando a vi á porta com o seu avental , aquelas roupas que pareciam sempre o arco-iris e o indespensavel xaile , percebi que aquele dia o calvário tinha acabado corri pra ela . A directora que lhe tinha aberto a porta travou-me violentamente , deu-me 2 safanões e uma tapa na cabeça e disse :
- Menino parvo , faz favor de ir buscar o seu casaco .
A minha avó levantou o chuço , dirigiu-se a ela e disse :
- Sua grande cabra , sua puta de merda , isso são maneiras de tratar o meu menino ?
Vou fode-la toda , vou enfiar-lhe o guarda chuva pela goela abaixo ...
A diretora virou costas correu e tiveram de segurar a minha avó que não parava de dizer :
- Sua badalhoca , sua cabra , vou mata-la ...

Foi um dos dias mais felizes da minha vida , não parava de dizer pra minha avó , és a maior vó e chamaste-lhe puta , não foi ?
A vozinha rematava , deixa estar quando apanhar aquela cabra na rua vou-lhe esgadanhar aquela cara toda ...

Quando cheguei a casa soube que tinha sido despedido , que lindo dia ...
A diretora telefonou a minha mãe , minha Srª não queremos que mande mais o seu filho pra nossa escola , a sua mãe é uma malcriada , fez aqui um escandalo ....

Como veêm cresci a ouvir não é com essa mão , com a direita , direita , esquerda , direita , e no meio de todo isto não havia ninguém capaz de me explicar razoavelmente
porque tinha de ser assim .
Mesmo o meu prof da 1ª e 2ª classe que era uma joia não me deixava usar a canhota , depois de muito o chatear ameaçou-me , se te volto a ver escrever com a esquerda vou obrigar-te a usares um pano amarrado á volta dela , a verdade é que um pano por cada vez tinha virado múmia .

Uma das coisas que os profs da época não gostavam de descurar era caligrafia , uma letra bonita , redondinha , com ligações perfeitas entre cada elemento era essencial . Para isso praticavamos imensas copias nos chamados cadernos de 2 linhas , cópias intermináveis , e era tão dificil manter as letras dentro das linhas , mas os resultados eram espantosos , havia caligrafias que eram verdadeiramente uma arte , uma arte que não estava ao meu alcance ... Se já tentaram escrever com a esquerda compreenderão facilmente .

Era uma questão de tempo até que o sr Areias fosse confrontado com a minha caligrafia , nunca pensei foi que reagisse tão mal :
- O que é isto ?
Nem sequer era tá mal , o que é isto ?
Caiu-me mal ...
Mesmo depois de lhe dizer que era canhoto , o que duvido que se tivesse dado ao trabalho de ouvir , continuou a insultar a minha caligrafia ...
Será que ele faria melhor se o obrigasse a escrever com a esquerda ?
Toda aquela opressão juntou-se e explodiu , sentia que a justiça estava do meu lado
e avancei :
- É o tipo de caligrafia que qualquer pessoa teria se fosse obrigado a escrever com a esquerda como eu sou obrigado com a direita , não tenho a precisão com a mão direita que tem qualquer outra pessoa porque sou canhoto , se me deixar escrever com a esquerda já sai melhor , não muito porque nunca tive oportunidade de praticar , porque sempre fui obrigado a escrever com a direita .
- Vai ao quadro ...
- Escreve o teu nome
Quando ia a escrever corrigiu , com a mão esquerda .
Escrevi e nova ordem , agora escreve por baixo com a mão direita .
Não é que ele ficou impressionado ? Ou então foi tocado por algum anjinho do ceu , pegou no meu caderno , deu dois passos e disse :
- Nos ditados onde tens de escrever rápido não te vou exigir uma caligrafia exemplar
, no resto não quero voltar a ver nada parecido com isto (levantando o caderno no ar) , mais dois passos , lançou o meu caderno no cesto dos papeis e continuou a aula ...



Contos da Primária , Texto 5

No meio de todo este circo de réguadas acabava por ser um preveligiado , como era bom aluno raramente apanhava por errar , quase tudo se resumia a umas reguadazitas nos ditados , onde um erro era uma reguada , sempre muito longe dos 10 , 20 ou 30 erros que muitos dos meus amigos cometiam , que inevitavelmente correspondiam a 10 , 20 ou 30 reguadas .
A verdade é que não imaginava o que era levar 20 ou 30 vezes com uma regua grossa nas mãos , pensei sempre que não podia ser muito diferente de levar 2 ou 3 , um dia descobri que era de facto muito diferente ...

O Guilherme , o Gui , era meu amigo e vizinho , estudavamos muitas vezes juntos , não sendo um optimo aluno , era uma aluno razoavel , contudo diante do Areias o medo bloqueava-o de tal forma que não conseguia responder a nada . Os interrogatorios da tabuada então eram uma desgraça , ele sabia a tabuada mas no momento da verdade simplesmente bloqueava . Depois hesitava a dar a mão e muitas vezes retirava-a e levava sempre sovas de caixão á cova .

Um dia fizemos ambos parte do grupo de alunos escolhidos para as perguntas da tabuada , como de costume ao fim de 5 minutos o Gui já tinha levado imensa porrada , aquilo estava a incomodar-me tanto que não resisti e numa das perguntas disse-lhe baixinho a resposta .
Fi-lo inconscientemente , sem pensar , sem medir as consequencias , normalmente nunca me atreveria a tanto , tinha noção que era das coisas que podiam enlouquecer a fera , mas fi-lo e o Areias topou ...
Mandou sentar os outros e perguntou-me se lhe tinha dito a resposta . A minha vida já estava em jogo , nem me atrevi a negar , isso seria certamente equivalente a um suicidio . Então virou-se para o Gui e disse :
- O teu colega ao segredar-te a resposta , não te está a ajudar , pelo contrário está a prejudicar-te , a impedir que aprendas , dado que foste tu a pessoa mais prejudicada com esta acção vais ser tu a castigá-lo .
Entregou-lhe a régua e um aviso , vais bater-lhe com toda a tua força caso contrario es tu quem leva ...
Lá estiquei a mão e o Gui deu-me a 1ª reguada ... O parvalhão nem sequer foi capaz de disfarçar , parecia mais que me estava acariciar a mão , mal senti a régua ....
Este erro custou-lhe meia duzia de reguadas em cada mão e fiquei eu e o Areias , frente a frente .
Primeiro lavou-me os ouvidos e depois deu-me tantas reguadas que perdi a conta ...
O mal das reguadas é que 2 ou 3 não são nada do outro mundo , mas depois de 10 ou 12 torna-se muito muito doloroso , as mãos incham , a pele arde e cada pancada parece dada directamente sobre os ossos .
Não lhe dei contudo o prazer de hesitar uma unica vez ao esticar a mão e olhei-o sempre olhos nos olhos enquanto levava . Não lhe queria também dar o prazer de me ver chorar , mas a meio as dores eram tantas que não consegui evitar que algumas lagrimas escorrecem pela face ...
Nesse dia tive de pedir a um amigo para me levar a pasta , não conseguia mexer as mãos e qualquer contacto era doloroso , estavam inchadas , enormes , vermelhas , nem pareciam as minhas mãos ...
Conclusão ? Espero que esse filho da puta esteja a arder no inferno ...



Contos da Primária - Texto 4

O Sr Areias proporcionou-me um dos espectaculos mais tristes que assisti em toda a minha vida .
Vivia-se entusiasmadamente o mundial de futebol 1966 , a edição de cromos com os jogadores das selecções tinha dado a volta á cabeça da putalhada , não se falava doutra coisa e tudo girava á volta disto .
O Fredo Ranhoso distinguia-se facilmente do resto da turma por parecer mais um pai que um aluno e ter constantemente o ranho a escorrer-lhe para a boca , havia reprovado 1 ano na 1ª classe , mais 1 ou 2 na segunda , 1 ou 2 na terceira e era também a 2ª ou 3ª vez que frequentava a 4ª classe . Com os seus 14 ou 15 anos , era muito mais alto e forte que qualquer um de nós com 9 ou 10 anitos , facto que sempre aproveitava para nos gamar os cromos quando jogavamos ao virinha , quer ganhasse quer perdesse pegava nos cromos , metia-os no bolso e perguntava , há algum problema ? Nunca havia problema ... Era um verdadeiro mafioso ...

Nós tinhamos um sistema escolar chamado " A Caixa " , pagavamos uma quota mensal que era abervada num autocolante na contracapa do livro de leitura e sempre que precisavamos dum lapis , dum caderno ou por exemplo uma borracha , estes eram distribuidos gratuitamente .
Um dia o Areias perguntou , ó Fredo tu não tens pago as quotas da caixa , pois não ?
Com uma lata descomunal e uns nervos de aço o Fredo levanta-se e dirigi-se ao prof dizendo , claro que tenho pago , veja tá aqui assinado pelo senhor , e poe-lhe o livro debaixo dos olhos .
Quando o Areias se apercebeu que ele tinha falsificado a assinatura ficou louco ,
o Fredo tinha resolvido investir o dinheiro da caixa em cromos do mundial e falsificado a assinatura do prof ...
Deu-lhe uma sova descomunal á frente de toda a turma , partiu mesmo a régua nas bochechas do rabo do miudo , e era uma regua bem grossa , empurrou-o varias vezes violentamente contra o quadro e as paredes , estalos , reguadas por todo o lado , nunca tinha visto um homem ser assim sovado e nunca tinha imaginado que alguem o pudesse fazer a um miudo .
Findo isto expulsou-o da escola .

Fiquei completamente abismado com o grau de violencia usado e a forma como foi usada , não só eu , toda a turma ficou em estado de choque , mais que tudo surpreendeu-me a atitude irracional do professor , bateu descontroladamente , como um louco possesso , se não tivesse visto nunca teria acreditado ...
Fiquei revoltado como nunca tinha estado antes , perdi todo o respeito e admiração que tinha por ele , aproveitei o facto que era católico praticante e pedi a Deus que o empurrasse pelas escadas abaixo e lhe partisse ambas as pernas ...

A mãe do Fredo obrigou-o a voltar á escola , pedir de joelhos desculpa ao professor e
pedir se o deixava voltar a frequentar a classe , que continuou a frequentar ...



Contos da Primária - Texto 3

Uma das maiores tormentas por que passavamos na escola primária , felizmente anualmente , era quando apareciam lá umas gajas vestidas de enfermeira para nos darem uma colher de oleo figado de bacalhau ... Esta substancia com grandes qualidades medicinais era distribuida por todas as escolas , uma prenda do Dr Oliveira Salazar , provavelmente preocupado com a saude dos seus futuros militares a quem esperava uma guerra colonial .

Para quem nunca provou , é um oleo que cheira e sabe a peixe podre desenterrado uns meses depois de ter entregue a alma ao criador , cheira-lo sem puxar vómito é de heroi , conseguir enguli-lo é uma façanha digna de figurar nos compendios de história ... Recusá-lo nas barbas do Sr. Areias um suicidio ...

Esta tortura acabava irremediavelmente em grandes sessoes de reguadas , havia sempre alguns que cospiam fora , uns vomitavam outros sentiam-se mal , alguns choravam e tudo isto era contabilizado em reguadas quando aqueles anjos do inferno abadonavam a sala .
Agora imaginem quem era sempre o primeiro a ingerir aquela mistela ?
É verdade , o Sr Areias ...

Os meus sentimentos em relação a este Sr eram confusos , não conseguia deixar de sentir algum respeito e admiração misturados com a repulsa da sua ligação aos castigos fisicos e ao medo , pelo papel primordial que atribuia á violencia na educação , todos os ideias salazaristas que nos vendia , e a noção que a melhor forma educar moralmente o individuo seria pela imposição de principios , cuja quebra teria como consequencia o castigo fisico . Apesar de ser apenas um miudo , sentia que aquilo tinha que ser errado , não me parecia correcto e tinha uma noção que não precisava de provas para acreditar que estava errado ...

Verdade seja dita nunca vi o sr Areias exigir de alguém algo que não exigisse de si próprio , nunca me lembra de o ter visto quebrar as suas proprias regras , embrulhar-se em algum tipo de favorecimento , era friamente calmo , nunca perdia as estribeiras , não é verdade , houve uma vez em que ficou completamente descontrolado e as consequencias foram pesadas , conto no proximo
post ...



Contos da Primária - Texto 2

        O meu relacionamento com o sr Areias teve um volte-face apos a 1ª prova de aferição . Fiz uma prova impecavel , sem erros , a melhor da classe ... A mudança no meu estatuto de " o transpirado de letra feia " para o " melhor aluno da classe " teve como consequencia imediata ter ganho o seu respeito e a minha vida tornou-se bastante mais facil .
        Se estão a pensar que era um génio, estão enganados . Dado que nesse tempo não havia infantarios , entre os 4 e os 7 anos , passava parte do dia com duas irmãs , professoras reformadas que comigo e mais meia duzia de putos formaram uma autentica classe de aula , aprendi a ler e escrever , tabuada , aritmetica ,ciencias naturais , história ... Quando cheguei á primária estava pronto para pro liceu ...

A verdade é que o Areias se tornou mais condescendente comigo e permitia-me amiude discordar , por vezes quase exigia , quando discordava fazia-o com palavras , não com a régua ... Também nunca foram muitas , só se não pudesse evitar , já se imaginaram a atravessar um campo minado ? Qualquer palavra caida podia despoletar uma catastrofe ...

Claro que isto mais tarde ou mais cedo se iria voltar contra mim ...
Um dia chego ao recreio , enorme confusão , o pessoal queria pedir ao prof se os deixava sair mais cedo 30 minutos para poderem ver um jogo de Portugal , não me lembra exactamente qual , acho que dava acesso creio aos oitavos de final ou parecido , a seleção portuguesa nunca na vida tinha chegado tão longe , tinhamos eliminado o Brasil , todos acreditavamos religiosamente que iriamos ganhar o Mundial e era a histeria total .
O problema era a falta de um voluntario com coragem suficiente e total desprezo pelas mãos , para levar o pedido ao prof .
Inevitavelmente surgiu a ideia que eu seria a pessoa ideal . Deixei logo claro que nem pensar , só se fosse maluco ou não gostasse das minhas mãozitas . Fui pressionado e encostado á parede , numa manobra desesperada de evasão disse :
- Tá bem , até o posso fazer mas quero 30 cromos e só de jogadores da nossa seleção .
Sabia bem os sacrificios que passavamos para arranjar os cromos e claro que ninguém iria estar disposto a abdicar deles .
O Fredo Ranhoso , com os seus 15 anos e 1 metro e setenta e tal de altura fez voz grossa e disse :
- Tá tudo a tirar os cromos cá pra fora , há algum problema ?
Tirou meia duzia de cromos a cada um juntou os 30 cromos , entregou-mos e meteu os restantes ao bolso . Concluiu :
- Bora lá , fala com o prof ...
De imediato deu-me volta aos intestinos , a boca estava tão seca que nem conseguia falar , tiha-me metido numa grande alhada ...

A aula começou e todo o pessoal me olhava e silenciosamente diziam com os labios , diz , anda lá , fala ....
Não tive outro remédio ...

Sr Professor dá licença que lhe faça um pedido ?
Os meus colegas pediram-me se falava com o sr, se nos poderia deixar sair mais cedo um bocadito para podermos ver o jogo de Portugal na TV , começa ás 5 horas . Tentei uma cartada de desepero , é o nosso Pais Sr prof , É Portugal ...

- Ai os meninos querem sair mais cedo da escola para irem ver futebol ?
Aquele tom sarcastico fez-me gelar a espinha , o prof continuou , os meninos que tem televisão levantem o braço .
A minha turma era quase exculisavemte formada por putos das ilhas , muitos nem 2 refeições por dia faziam , quanto mais ter uma TV , tres gatos pingados puseram o dedo no ar ...
O Areias continuou , deixa-me ver se percebi bem , tu interrompeste a minha aula para me pedires para sairem mais cedo , para verem um jogo de futebol numa televisão que não esiste , é isso ?
Nem respondi , acho que também já nem seria capaz de articular uma unica palavra ...
O prof tirou os oculos , fez uma pausa de alguns segundos que pareciam dias e rematou :
- Muito bem , podem todos sair ás 5 menos um quarto , todos menos o Ad que vai ficar aqui comigo até tocar a fazer uns exercicios .
Naquele momento mesmo que tivesse dito que tinha de ficar um mes , dia e noite , teria ficado muito feliz ...

Sairam todos , fiquei eu e prof , deu-me uns exercicios para fazer e passado 10 minutos disse :
- Arruma as tuas coisa e vai embora , livra-te de mais alguma vez interromperes a aula seja por que motivo for , estamos entendidos ?



Contos da Primária , Texto 1

       Os meus primeiros quatro anos de escola foram divididos entre o ceu e o inferno . È usual dizer-se que nas escolas do antigo regime a réguada era a lei , não é totalmente verdade , haviam também as canadas ( nada confortaveis essas canas ressequidas quando descreviam todo aquele arco e aterravam directamente nas nossas orelhas ) , mas muitos professores havia que simplesmente não tocavam nos seus alunos , apesar de ser uma opção perfeitamentente institucionalizada , calculo que não o fizessem por questão de principio ou fossem simplesmente pessoas com um bom coração ..
        O meu primeiro professor , o Sr Natal , fazias jus ao seu nome , durante os dois anos que estive com ele , os meus primeiros na escola , nunca o vi encostar um dedo num aluno ou aplicar qualquer outro tipo de castigo . Era exigente quando ensinava mas brincalhão quando havia tempo , tratava-nos com imenso carinho e era muito muito paciente apesar dos seus 60 anos .

        Ao fim de dois anos mudei de professor , fui para a classe do diretor , o Sr Areias , a sua reputação hoje em dia poderia ser comparada a de Bin Laden e não foi dificil perceber porquê .
        Fui transferido não conhecia ninguem , sentei-me muito caladito e esperei que tocasse . Tocou , passou 1 ou 2 minutos , o prof não chegava , começou a gerar-se aquele burburinho , vem , não vem , até que alguem gritou VEM AÍ ...
Fez-se um silencio de morte , podiam-se ouvir as moscas a zumbir ... O Sr Areias chega , não diz uma palavra , dirige-se á secretaria , abre a gaveta , saca duma regua grossa . O meu colega de carteira , o Angelo, a quem chamavamos "a menina", desata logo a chorar . Atónito vejo o prof começar no 1º aluno junto á porta e terminar no ultimo do lado oposto destribuindo 6 reguadas a cada aluno .
        Não era normal , aquele gajo que não conhecia de lado nenhum , ainda não me dirigira uma unica palavra e já me tinha espetado 6 reguadas , as minhas primeiras reguadas e eu nem sabia porquê ...
       Na primeira oportunidade perguntei "á menina" o que tinha sido aquilo , explicou-me que quando chegava se ouvisse o minimo barulho levava tudo pela medida grande , sem exepções ...
       Começaram aqui as minhas primeiras duvidas sobre as vantagens da democracia ...
        Chega o intervalo , grande farra , toca para entrar , está o prof na porta régua na mão , passa , passa , tu prá li , passa , passa , passa , tu pra li , quando entrei fui dos "pra li" , mais 6 reguadas , sem saber ler nem escrever , sentei-me perguntei ao colega , carago e agora porque é que levei ? Foi por estares a transpirar ... Os que chegam transpirados do recreio levam ...
        Que saudades do professor Natal ....
        O prof faz uma pergunta , ninguem responde , levanto-me e respondo , na boa , mais 4 reguadas e fiquei a saber que só devia responder depois de devidamente autorizado .
        A verdade é que depois de conhecer as regras aquilo ás vezes até era divertido e não eram uns bolitos que me iam tirar a boa disposição .... E até havia dias em que o Areias estava bem disposto , em alguns até chegava a sorrir ...

        O SR. tinha um metodo muito especial de ensinar a tabuada , chamava meia duzia de alunos ao quadro , regua na mão , como era habito , perguntava 8x4 ? Tinhamos uma fracção de segundo para responder e se não soubessemos uma outra fracção para esticar a mão , mais 2 reguadazitas , a coisa triplicava se hesitassemos a dar a mão e se a retirassemos no momento da verdade os numeros variavam conforme o humor .

       Curiosamente aceitei aquilo muito bem , desde pequeno entendi a dor como apenas um momento passageiro , quase como comer uma malagueta , arde mas passa rapido , as reguadas não eram muito diferentes ...
        Embora não concordasse com os seus metodos nunca achei que fosse uma má pessoa , agradava-me o facto que não establecia diferenças , algo perfeitamente institucianalizado , também nunca me pareceu que tivesse prazer em castigar ou se sentisse bem em faze-lo , acho que simplesmente não sabia ser doutra forma .
        Um dia , depois de ser cliente habitual das reguadas por transpiração e de ter também já ganho um pouco do seu respeito , assim que tocou para entrar isolou-me . Já viste como estás ? Encharcado em suor , achas que estas em condições de assistir a uma aula ? Parece que gostas de levar umas reguadas ...
       Baixei os olhos e fiquei calado , ele insistiu , responde ...
       Ao contrario da generalidade da turma , evidentemente tinha medo mas não me aterrorizava , tinha consciencia que quando falava com ele devia medir muito bem as palavras , se não queria ficar com as mãos como um cepo , mas achava-o uma pessoa acessivel e justa á sua maneira , assim respeitosamente expliquei-lhe , sr professor eu transpiro muito , dou 2 corridas e fico assim , a unica forma de o evitar era chegar ao recreio e sentar-me enquanto todos os outros meus amigos brincam e não acho que seja justo , cumpro os meus deveres , estudo , faço sempre os trabalhos de casa , estou atento nas aulas , colaboro sempre que posso , mereço brincar durante o recreio como os outros .
        Fez-se um silencio angustiante que parecia não ter fim , até que o prof disse , vai-te sentar , faz favor quando acabar os recreios passas no WC , lavas a cara e a cabeça e enxaguas-te .
Durante um tempo esqueceu as transpirações e nunca mais foi tão rigoroso , mas volta e meia iamos a entrar todos esbaforidos , tu , tu , tu e tu , que é que os meninos andaram a fazer ? Há que esticar a mão ... Escusado será dizer que eu era o presidente honorario ...



Antologia do Poder IV , O Território

Não pensem que eramos a unica tribo , uma especie excentrica de tarados , nem sequer que eramos os piores , bem longe disso , por muito parvo que vos possa soar , um puto deslocar-se só por qualquer zona ia ter problemas , havia algo que impelia os putos a organizarem-se e não gostar de ver miudos desconhecidos no seu territorio . Não lhe iam dar uma facada , ninguem usava facas , nem espanancá-lo , se calhar nem lhe tocariam , mas faziam-no passar um mau bocado , era a lei , não era a exepção era a regra... E havia zonas onde os putos eram mesmo do pior ...
Mais estranho ainda é que não acontecia com adolescentes ou homens , afectava mesmo só aquela faixa etária entre os 6 e os 10 ou 12 anitos . Não existiam gangs , não havia um exemplo influenciador , havia muito pouca TV , apenas 1 programa e religiosamente controlado , nem sequer havia muita criminalidade , mas havia uma tendencia nata para o facto . Acho que era tão normal como os putos hoje gostarem do Songoku . Não era novidade para nenhum de nós que se tivessemos de nos deslocar na cidade sozinhos iamos ter muitos problemas com os bandos de putos que encontrassemos no caminho e havia putos que nunca mais acabava , eram mais que as mães ... Ser duro e intimidador era uma vantagem a não desprezar , podia poupar muitos problemas a quem se podia dar a esse luxo , os enfezados e as "meninas" tinham uma vida dificil .
Não consigo deixar de me perguntar o que levava miudos a serem tão insensiveis e
crueis e duma forma tão natural , certo que havia muita pobreza mas isso não explica tudo e as pessoas que os cercavam nunca me pareceram crueis ou insensiveis , verdade também seja dita nunca houve agressoes violentas , uns estaladoes , uns pontapes no cu , umas parvoices , não havia verdadeiramente intenção de magoar , não fisicamente , mas também não ignoravam que estavam a magoar psicologicamente . Curiosamente isto acontecia maioritariamente no territorio do grupo . Um grupo que se deslocasse pela cidade poderia passar por outros putos e nem lhes ligar , mas na sua zona não deixaria passar um unico sem o torturar um pouco .



Antologia do Poder III , Ascensão e Queda

Talvez achem tudo isto uma selvajaria , eu pelo menos acho , existiam contudo muitas condicionantes socias a trabalharem por tras destes comportamentos . Talvez houvesse mesmo uma noção incosciente do grau de preparação necessario á sobrevivencia , os tempos iam melhorar mas nós não sabiamos ...

Eramos uma tribo destinada á extinção , mas também não o sabiamos, quando se é criança não se tem noção do futuro , não como nós adultos pelo menos .
Afinal nem foi o tempo , o nosso inimigo natural que nos venceu , eram tempos de mudança , levantavam-se os actuais ghettos que na altura chamavam de habitação social , recolocação , mudas , cada vez mais ilhas desertas , depois das guerras pela ilha Velha , agora em pouco tempo haveria uma ilha para cada um , todos os dias algúem partia ...
Mas alguns também chegavam , foi o caso do Luis , tinha o carisma dum lider , e trazia uma lufada de ar fresco , era corajoso mas preveligiava a inteligencia , algo que os nossos liders não tinham e desprezavam . O Luis desafiava constantemente o poder central demonstrando constantemente a parvoice e incoerencia das ideias do Fredo , era uma questão de tempo até que rebentasse uma luta pelo poder e que
teria de forçosamente passar pelo confronto direto entre os dois .
O Fredo pra porrada era obra , tinha a experiencia dum catedratico , de qualquer forma entre nós as lutas , não que fosse decretado , talvez aceite como factor de sobrevivencia , eram tipo uma luta de dominio , geralmente rebolabasse com o outro no chão , torcia-se pescoço , mãos , pernas , até que ele se rendesse . Não havia murros , pontapes , trincadelas , cabeçadas , não com os membros da tribo ... O Luis não era violento mas era forte , atletico, não era quesilento mas também não fugia á luta e os ingerdientes estavam juntos ...

Apesar da inexistencia de golpes violentos foi um combate digno de ser visto , sem nenhuma vantagem aparente para algum dos lados até o Heroita ter saltado sobre o Luis em ajuda do Fredo , o gesto irrefletido do Heroi foi o sopro da morte num grupo doente , os dois dominaram-no facilmente mas perderam o respeito do grupo e o direito de o liderar , a cisão era inevitavel , dum lado os apoiantes do Fredo do outro os do Luis . Quando nos separamos eramos já apenas meia duzia de gatos pingados a quem o destino e tempo enguliriam .



Antologia do Poder II , A Primeira Baixa

Nos tempos da Ilha Velha ninguém tinha brinquedos , acho que nem tinhamos a noção precisa do que eram brinquedos , não foi por isso que deixamos de industrializarmo-nos ...
As qualidades necessárias aos artigos eram simples , a matéria prima devia estar á mão de semear , para não dar origem a muitas ondas serem os mais parecidos possiveis e ter uma utilização que provocasse jorros de adrenalina no seio dum grupo rebelde mas bem hierarquizado .
A primeira peça a sair da linha de montagem foi o arco com a gancheta , uma produção fácil ,consistia em gamar de qualquer lado um aro metalico fino com 30 a 60 cm de diametro e construir com arame uma gancheta com uma curva lateral num dos extremos , que servia para empurrar e equilibrar o arco durante as corridas .

Se se estão a perguntar onde entra a adrenalina numa corrida de arcos com ganchetas é porque nunca experimentaram correr num passeio equilibrando um arco com um arame , o que limita o tempo em que podemos levantar os olhos para escolher o percurso , os lampiões , as pessoas em contramão , um poletão compacto onde passar uma palheta ao gajo da frente ou ser rasteirado estava apenas dependente das alianças e desavenças que o tempo cimentava e um constante chega para lá onde as cabeçadas laterais , as cotoveladas e os empurrões eram sempre mais importantes do que a corrida .
Perto da meta já ningúem pensava nas ganchetas , o importante era ganhar , o aro numa mão e a gancheta noutra , eram os 100 metros livres , quando restava algum folgo as acusações de deslealdade e falta de fair-play alteravam de novo o rumo desportivo e tinhamos luta livre ...
No meio de tudo isto havia uma regra que era importante não quebrar , chorar era algo inaceitavél punido com a explusão da tribo , as meninas é que choram , era a regra nº 1, e ali não havia lugares para meninas ...
As cicatrizes eram ostentadas com orgulho , era uma cena de machos latinos ...

Se estão a achar tudo isto muito selvagem esperem até vos contar do nosso hospital, é verdade tinhamos um hospital , de insectos ... Era tão dificil encontrar insectos doentes que optamos por experiencias geneticas , melhorar e corrigir dentro dos possiveis as falhas do criador , alguns tinham asas exageradamente grandes , demasiadas pernas , muitos pelos , se calhar eram mais experiencias de cosmetica do que genetica , nós gostavamos de pensar que estavamos a melhorar a natureza ... Mas levavamos o assunto muito a sério , deixar morrer um paciente não era opção e o
coitado envolvido num caso de negligencia médica o mais provavel é que além do risco de expulsão da ordem tivesse que comer o cadaver ....

Um dia a tribo foi confrontada com uma situação para a qual ao contrario do habitual não tinha um plano A muito menos um B , morreu um dos membros do nucleo duro , o "maluco" , o mar ficou com ele .
Não era por acaso que lhe chamavamos o maluco , era maluco , tinha cara de maluco e só fazia maluqueiras , era o nossa ponta de lança , sem a minima noção do perigo e uma atração fatal por ele , nos tempos de crise , nas guerras dos calhaus , comandava as tropas , 10 metros á frente , sem escudo , as pedras que chuviam á volta não o pareciam incomodar , catalizava as nossas energias e tornava-nos invenciveis ... Perguntava-me frequentemente como é que o Maluco era atingido tão poucas vezes , talvez as pedras se assustassem com aquele olhar tresloucado ou achassem que nem sequer havia espaço naquela cara para mais uma cicatriz , a sorte protege os audazes ?
Afinal naquele tempo todo vi-o apenas 1 ou 2 vezes com a cabeça rachada por uma pedrada .
Ninguem percebia muito bem porque ele não estava ali connosco e ninguem sabia também muito bem onde estava , no dia do enterro foi feita uma reunião informal e aberta uma exepção á nossa regra nº 1 , nesse dia todos aqueles que choraram não seriam considerados umas "meninas" , qualquer acusação desrespeitosa aludindo ao facto teria consequencias ...



Antologia do Poder I , A Guerra dos Calhaus

Quatro decadas atras , quando era um miudo , O Porto tinha uma densidade populacional enorme , a rua onde o meu pai tinha uma lojita , a Rua do Paraiso , tinha imensos prédios , a diferença é que eram prédios deitados , as chamadas ilhas , um corredor estreiro com muitas casas de ambos os lados , casa minusculas , entre 15 a 30 metros quadrados , os quartos de banho sem chuveiro ou agua quente e um buraco para as necessidades , a chamada cagadeira á caçador , eram um bem comum ... Muitos miudos dormiam na cama com os pais , aos pés , e um simples pão com qualquer recheio era uma iguaria que qualquer um estaria disposto a gamar até ao melhor amigo...
Felizmente nunca passei a fome , não sendo uma familia rica ( nem de longe , muito longe ...) nunca passei por essa privação . mas tinha muitos amigos que lhes saltariam os olhos da orbita se lhes representasse um bom prato de sopa .

A falta da televisão tinha as suas reprecursões , cada familia tinha montes de filhos, a falta de espaço para brincar podia ter consequencias drasticas e levar mesmo á guerra ...

A Ilha Velha era um conjunto de ilhas em ruinas , os moradores tinha sido deslocados para que o local desse origem a uma passagem com um parque de estacionamento que ainda hoje não existe , mais tarde foi colocado ai um infantario , em pré-fabricados e parte dos terrenos vendidos para construção .
Esse era o nosso parque infantil ...
Os problemas começaram a surgir quando os putos da Regenração , a viela que limitava a Ilha Velha pelo outro lado , decidiram que aquilo tambem lhes pertencia .
E foram-se agravando sempre que o grupo deles apanhava sós algum de nõs ou nós apanhavamos alguns deles , as tentativas de pacificação saiam sempre goradas .
A primeira , um jogo de futebol , nem 5 minutos durou antes de começar tudo á pêra , as seguintes não tiveram melhor desfecho , estavamos num impasse e a unica solução encontrada foi um guerra de calhaus que decidiria quem ficava com o local ...

Muitos de voces que nunca serviram estruturas para-militares talvez não saibam o que é uma guerra de calhaus , é simples , como as proprias palavras o dizem era uma guerra onde a arma era o arremesso de calhaus , a única proteção eram os escudos , as tampas metalicas que sacavamos dos baldes do lixo .
Os dois grupos colocavam-se á distancia necessaria para alcaçar o oponente e era uma pedra ...
Foi marcada adata , ficou claro que quem se cortasse tava feito ao bife e foi mesmo criado um pequeno tribunal para julgar casos de deserção e cobardia ...

Ganhamos o local , apenas com 4 baixas , 4 cabeças rachadas , umas negras no corpo , nada que um soldado não estivesse habituado ...

Como se ganha uma guerra destas ? Simples , vamo-nos aproximando lentamente do adversario , intimidando-o até que a coragem se vá e desate a pirar-se com as pernas a bater no cu .
No ponto mais alto hasteamos a bandeira que fizemos , como veêm a moral era alta , o nosso capitão era o Fredo Ranhoso e o seu braço direito o Heroita ( alcunha derivada do nome dum chines que diziam ser a pessoa mais feia do mundo , mas ele não conheciam o Heroi , diminuitivo amoroso como tratavamos o Heroita ) ...